Para o Dia do Folclore de 2016
22 de agosto: Dia do Folclore
Olivaldo Júnior
Não é que dia desses, numa rua da cidade de Mogi Guaçu, Estado de São Paulo, no país do pau-brasil, quando eu menos esperava, ela passou? Os mesmos cabelos brancos, os mesmos óculos, a mesma carinha de quem fez muita arte com os livros e não se livra mais deles, a Dona Benta, a adorável vovó de Pedrinho, Narizinho, Emília e de todos nós, a eterna vovó passou por mim e, como se não fosse uma personagem, sentou-se num dos bancos lá do Parque dos Ingás e se pôs a esperar o próximo ônibus para o famoso sítio. Eu, com o coração aos pulos, fiquei em dúvida, tocado de emoção e, num gesto de extrema ousadia, sentei-me ao lado dela. Será que só eu a enxergava? Será que ninguém a via naquela estação rodoviária municipal? Tomado de súbita coragem, arriscando vê-la esvanecer-se em fumaça, toquei-a no braço e, sem piscar, lhe perguntei:
- Dona Benta, é a senhora?!
Segura de si, numa calma que só dela, me disse:
- Sim, rapaz, sou eu. Perdão, mas já nos conhecemos? Qual a sua graça?
Estupefato, sem poder acreditar em quem eu via e ouvia, lhe respondi:
- Olivaldo Júnior, vovó. Era, quer dizer, sou muito fã da senhora. Cresci assistindo a suas aventuras na tevê. Meu Deus, nem posso acreditar que estamos conversando!...
- Pois acredite, meu jovem. Estamos não apenas conversando, mas sentados lado a lado, esperando ônibus, um fato tão comum, tão trivial, tão cotidiano quanto os maiores sonhos e a mais pura realidade. Lobato que o diga...
Querendo aproveitar ao máximo aquele instante, para mim, de puro encantamento, quis saber como é que estavam os amigos lá do Sítio.
- Todos bem, graças a Deus. Narizinho tornou-se investigadora. Pedrinho, caçador de recompensas. Emília virou uma das grandes atrações do Cirque du Soleil, a danadinha!... Tia Nastácia, uma das grandes vencedoras daquele famoso programa de culinária. Como se chama mesmo?... Ah, me lembrei! Masterchef. Enfim, cada um se saiu bem a seu modo. Eu, como vê, não mudei muito. Ando por aí, buscando um novo ônibus para algum lugar em que me escutem. Você está me ouvindo?
Boquiaberto com tanta novidade, quis saber do malandrinho mais negro que a noite sem lua, que o poço sem fundo do fim do mundo. Quis saber do Saci.
- Ah, você não soube?! O "capetinha" está no topo da lista dos atletas paraolímpicos! No Atletismo, ninguém o vence. Um orgulho! Nós, que armamos até arapucas, armadilhas para prender o danado, não podíamos prever o seu sucesso... Fez de um limão a limonada de sua vida. Mas o que você faz mesmo? Tem cara de escritor.
- Acertou, Dona Benta! Quer dizer, escritor, escritor mesmo, não sei se eu sou. Mas tento, todo dia, alguma coisa. E o Visconde? Que fim levou, vovó?
Ajeitando seus óculos de aros grossos, atenta, como se quisesse sair bem na foto, me disse:
- Visconde fundou nossa Academia Tucanense de Letras, a qual vai muito bem, com Machado de Assis como Vice-Presidente, Monteiro Lobato como Suplente Número Um e, quem diria, eu, Dona Benta, como Presidente. Acredita? Só o Visconde mesmo!... - E se riu.
Nisso, enquanto eu também me ria com as novidades, um ônibus como aqueles de antigamente adentrou o Terminal Rodoviário dos Ingás, e, se despedindo de mim com um beijinho na testa, lá se foi Dona Benta com seus amigos de outro tempo, para o Sítio do Picapau Amarelo, para as terras de Lobato, onde exist(e)ia petróleo, sonhos e muita, muita imaginação.
- Adeus, vovó! Gostei de encontrá-la! Até logo!...
Ops, o ônibus para o bairro em que moro já vem. Licença, eu já vou. Feliz Dia do Folclore pra nós!
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